sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Percursos-2

Karl Marx é muitas vezes citado como tendo definido a religião como uma espécie de ópio que se dá ao povo para o enganar. Povo que ninguém foi ainda capaz de dizer quem. Se sou eu e tu, se somos todos, se são coitados, esfarrapados, desgraçados, vítimas de uma sociedade organizada para proteger os mais espertos, que arranjaram uma situação de vantagem à custa dos outros a quem não foi dada essa vantagem, ou então que não foram suficientemente espertos, ou que não estiveram suficientemente alertas para não se deixar explorar, ou, simplesmente, porque não tiveram outra alternativa ou meios de defesa. Como poderiam, se os outros sabiam mais? Como poderiam se os outros já tinham mais? Se nem sequer a natureza distribuiu igualmente a esperteza. Aqui começo a confundir natureza e Deus. Ou a juntá-los como a mesma realidade. Tenho a capacidade de pensar que leva a perceber que há algo que se chama realidade. Mas também a capacidade de pensar que aquilo que penso ser realidade não é a mesma coisa para todos. Será que cada um tem a sua realidade?
Tantas vezes tenho discutido aquilo que penso ser a realidade para no fim verificar que essa não é, para os meus interlocutores, a realidade. Esse limiar que separa o que para uma pessoa considerada lúcida daquilo que um alucinado toma por realidade. Onde termina a realidade do são e começa a do alucinado? O que é a lucidez? Como determinar e quem determina. os limites da lucidez, ou os padrões de aferição da lucidez. Será, por exemplo, o misticismo religioso um estado superior de lucidez ou um estado mental provocado pelo efeito físico, neurológico, psíquico, de componentes químicos do organismo do homem que influem no seu comportamento ou o determinam, ou serão, inversamente, essas reacções desencadeadas pelos processos mentais e que explicariam, por exemplo, o fenómeno de estigmatização nos místicos? Como se ascende do físico ao espiritual e ao místico? Haverá uma inteligência biológica, na falta de outro termo, que se reflecte no que se chama instinto, intuição, capacidade que se desenvolve mais nuns do que noutros, em função das necessidades de adaptação aos meios em que cada ser humano habita e se desenvolve?
Pertencemos a uma civilização em que os dados de conhecimento a partir dos quais formulamos juízos sobre os outros não englobados por este conceito de civilização, nos são fornecidos pelas pesquisas, análises e conclusões da Antropologia, Sociologia, Psicologia, Filosofia, as principais disciplinas do estudo e conhecimento do homem e do universo, matéria em que pouco temos avançado desde a Antiguidade, desde Platão, Sócrates, Aristóteles.